Ecoh

“O ECOH é um evento muito esperado por quem já teve oportunidade de assistir. Uma das professoras contou que ela e os alunos andaram 10 km para ver uma apresentação porque na escola deles não tinha programação naquele ano.” – Sônia Biscaia

Entrevista por Christina Mattos | Fotos: Acervo ECOH e Cia Som de Vento

O ECOH foi tema de pesquisa acadêmica na Universidade Estadual de Londrina. A catarinense Sônia Biscaia é a autora da dissertação  Tecendo afetos: O contador urbano e o arvorecer do ECOH – Encontro de Contadores de Histórias de Londrina, apresentada em 2021 no Programa de Pós-Graduação do Curso de Letras.

A proposta era entender quem é o contador de histórias urbano e também investigar como o festival contribui para a dinâmica cultural e social da cidade. 

Sônia voltou a viver em Joinville, Santa Catarina, sua cidade natal. Está atuando como contadora de histórias, atriz, produtora cultural e pesquisadora de narrativas de tradição oral. 

É também integrante da Cia. Som de Vento convidada para a 11ª edição do ECOH, com o espetáculo Mariana e Mário ou Do Encontro do Rio com o Mar.

Na entrevista ela fala sobre o trabalho acadêmico e de como esse mergulho na contação de histórias mudou a vida dela.

Como foi a experiência de estudar o ECOH para a dissertação?

Sônia Biscaia – Estar entre os contadores, ouvir suas histórias, conhecer o funcionamento de um evento tão bonito foi muito além de uma pesquisa acadêmica. Foi importante para mim, não apenas enquanto pesquisadora, mas como pessoa. 

Qual é a importância do contador de histórias hoje em dia?

No ECOH eu ouvi a Gislayne Matos (pesquisadora e narradora) dizerque o contador de histórias é necessário para lembrar da humanidade em cada um de nós, para nos lembrar da gente mesmo. A importância disso ficou ainda mais clara durante a pandemia.

O contador de histórias mostra que aquilo que existe dentro de nós vive. Que somos vivos quando a gente compactua com o outro, quando a gente anda junto com o outro, aberto a novos olhares. 

As histórias vêm das experiências de diversos povos que viveram antes de nós e seguem vivendo através da palavra, da oralidade. Isso mantém viva uma comunidade, um país, uma nação. 

A palavra tem muita força e o contador beneficia a todos com essa palavra. Traz vida, mantém a chama contínua, mostra que vivemos aquilo que alguém já passou e me conta o que eu preciso ouvir.

Acho que uma coisa bonita no ECOH é esse encontro de pessoas que pensam, que se juntam e vivenciam essa humanidade.

Como você avalia o repertório de histórias que o ECOH oferece?

O ECOH privilegia bastante a diversidade. É muito importante ter a representação de diversos povos por meio das histórias que vêm da África, da China, do Japão, de vários países da América Latina, de todas as regiões do Brasil, dos povos indígenas, de tantos lugares.

Assim podemos ver como muitas histórias se cruzam. Histórias, muitas vezes, são formas de explicar as coisas no mundo. Uma nação tem uma versão de algo que é muito semelhante a história de uma outra nação que vive do outro lado do planeta. 

Muitas histórias antigas traduzem modos de pensar que se mantêm vivos. Então é um meio pra gente entender o outro, compactuar com o outro, compreender diferenças e também perceber o que temos em comum.

O ECOH faz um trabalho importante nesse sentido, de tirar a gente do nosso mundinho. De trazer sempre histórias com representatividade feminina, africana, afro-brasileira, indígena, cabocla, ribeirinha, asiática, latina… Com certeza essa diversidade é fundamental pra repensar o mundo, muito além do nosso próprio mundo. Perceber o quanto existe e que a gente desconhece. Ver como é bonito olhar esse caminhar da humanidade com a ajuda das histórias. 

Você mapeou a extensão do ECOH. Qual o impacto que percebeu no público?

Acho que o festival tem um impacto muito grande, porque consegue atingir vários públicos fazendo apresentações dentro das escolas, mas também em teatros e praças. 

Possivelmente, a comunidade de algumas escolas não teria condições de vivenciar essa prática artística em outro contexto. Eu conversei com alunos que disseram nunca ter visto nada parecido. É a formação de um público infantil e juvenil que não teria acesso de outro modo.

Quando eu fiz o mapeamento da atuação do ECOH em 2019, foram muitas ações em muitos bairros, praticamente em todas as regiões de Londrina. É bonito ver como isso vai tomando uma proporção enorme à medida que constatamos que já foram 10 edições.

O ECOH é um evento muito esperado por quem já teve oportunidade de assistir. Uma das professoras contou que ela e os alunos andaram 10 km para poder ver uma apresentação, porque na escola deles não tinha programação naquele ano e não havia ônibus para levar a turma até o local da contação de história. Foi um desejo dos próprios adolescentes ir a pé.

Não são só as crianças que gostam, os adolescentes também e outros públicos que encontram o ECOH na rua, nas praças, nas áreas abertas. É um festival que vai impactando várias faixas etárias. 

Eu entrevistei pessoas que me falaram que depois que assistiram uma apresentação pela primeira vez, passaram a ter um outro olhar para o seu próprio pensar. Começaram a frequentar vários eventos culturais, começaram a contar histórias, buscar pelos narradores antigos das suas famílias. Então, certamente, O ECOH tem um impacto muito grande no público. 

– E na sua vida? O que mudou depois do ECOH?

Sônia Biscaia – Hoje eu estou trabalhando bastante em contação de histórias, teatro e outros projetos culturais. Estou vivendo isso e muito do meu presente tem relação com o que experienciei no ECOH.  Eu sou realmente muito grata. A dissertação foi um presente para a minha vida, para o meu pensamento enquanto profissional, enquanto pessoa. Tenho realmente um carinho muito grande pelo ECOH, pelo que ele significou na minha vida pessoal.